O DESENVOLVIMENTO DA VELOCIDADE
O DESENVOLVIMENTO DA VELOCIDADE

1. Introdução

    Na actividade desportiva, o praticante procura, através do seu corpo, que é, simultaneamente, sujeito e objecto da acção (Panafieu, 1984), jogar sobre o tempo no sentido de modificar as suas acções para melhor se adaptar ao envolvimento (Jalabert, 1998).

    Neste contexto, a velocidade motora, entendida como uma capacidade humana que condiciona a realização dos movimentos desportivos, constitui um factor do rendimento ao qual se tem vindo a atribuir grande importância. Treinadores e investigadores têm voltado as suas preocupações, não só para as formas de manifestação que a caracterizam, mas também para o modo de as transformar em indutores de eficiência e eficácia das acções desportivas.

    Curiosamente, este realce dado à velocidade parece faz parecer omisso o velho ideal olímpico grego, segundo o qual o desporto constituiria a via para o Homem chegar mais longe, saltar mais alto e ser mais forte (Citius, Altius, Fortius).

    De facto, à luz das exigências do desporto actual, não basta chegar mais longe, nem saltar mais alto, nem ser mais forte, é preciso ser mais rápido, mais veloz. Mais rápido, não apenas a chegar ao local desejado, ou a realizar uma acção, mas também a pensar, a encontrar soluções, a perceber o erro, a descodificar os sinais do envolvimento. Em síntese, mais rápido e melhor, a perceber, a pensar e a agir.

    Este ponto de vista admite, implicitamente, que o ideal olímpico parece omitir uma dimensão fundamental da prática desportiva enquanto actividade humana: a inteligência. Não uma inteligência abstracta e estática, tantas vezes enfatizada, mas uma inteligência do comportamento motor, através da qual o Homem, não só se adapta estrategicamente às exigências colocadas pelo envolvimento, como também está capacitado para nele provocar, intencionalmente, alterações que lhe sejam favoráveis.


2. A(s) velocidade(s) nos jogos desportivos colectivos

    O contributo relativo da velocidade para o rendimento varia de acordo com as exigências de cada modalidade desportiva (Dick, 1989).

    Os jogos desportivos colectivos (JDC) constituem modalidades que se caracterizam por complexas relações de oposição e de cooperação que decorrem dos objectivos dos jogadores e das equipas em confronto e do conhecimento que estes possuem do jogo, de si próprios e do adversário (Garganta & Oliveira, 1996).

    Dado que, neste contexto, a dimensão estratégico-táctica assume um papel determinante, o conceito de velocidade transcende claramente a concepção clássica que a define como a capacidade de executar acções motoras no mais breve tempo possível.

    Estamos, portanto, perante um problema de adequação da expressão da velocidade às tarefas a realizar. Nas modalidades que fazem parte deste grupo de desportos, o que se demanda constantemente é uma síntese entre velocidade e eficácia na tarefa, o que implica perceber a importância que assume a unidade entre o sistema perceptivo e a velocidade de realização.

    As interacções do sistema perceptivo com a velocidade de realização organizam-se em torno de três eixos (Jalabert, 1998):

  • selecção das informações - o jogador de alto nível ganha tempo seleccionando, cada vez mais rapidamente, num caos de informações, aquelas que lhe são mais úteis para atingir o objectivo;
  • ligação entre as informações - o jogador de alto nível invoca as experiências passadas para prever as consequências das acções que realiza. Nesse sentido, é capaz de estabelecer conexões entre elementos como a orientação dos apoios, a postura do adversário, as linhas de força da defesa contrária, as trajectórias imprimidas à bola, e outros, os quais se revelam determinantes para a obtenção de sucesso;
  • reorganização sensorial do controlo do movimento - ao invés do principiante, para quem o controlo visual da bola é indispensável, o jogador confirmado utiliza a propriocepção, o que se torna mais económico em termos de tempo, dado que tal o disponibiliza, do ponto de vista cognitivo, para o tratamento da informação.

    Face a este cenário, parece pertinente considerar não uma, mas várias formas de velocidade. Aliás, Weineck (1994) e Gambetta et al. (1998) ilustram bem este facto, no âmbito do Futebol, ao considerarem a coexistência de sete formas:

  • a velocidade de percepção - relacionada com a habilidade para processar estímulos auditivos e visuais e tomar decisões a partir de uma variedade de escolhas dependentes de uma situação particular;
  • a velocidade de antecipação - relacionada com a habilidade para prever as probabilidades de evolução das linhas de força de uma situação;
  • a velocidade de decisão - relacionada com a habilidade para, após ter analisado uma situação, decidir o que fazer;
  • a velocidade de reacção - relacionada com a habilidade para reagir a uma acção ou estímulo prévio;
  • a velocidade de movimento sem bola - relacionada com a habilidade para executar acções sem bola (desmarcações, tackles, marcações, saltos, mudanças de direcção e outras);
  • a velocidade de acção com bola - relacionada com a habilidade para executar as habilidades técnicas específicas, na relação com o móbil do jogo;
  • a velocidade de acção de jogo - relacionada com a habilidade para tomar decisões durante o jogo e executá-las em relação com as condicionantes técnicas e tácticas, i.e., para agir correctamente, no tempo certo.

    Se tomarmos como exemplo a corrida dos jogadores, nos JDC, constataremos que ela não é linear nem a meta é antecipadamente conhecida. Os praticantes deparam com muitas e variadas "metas" a atingir ao longo do jogo, pelo que o desenvolvimento da velocidade assume contornos complexos.

    Atentemos noutro exemplo. No Andebol, no Basquetebol e no Futebol, os estímulos visuais são prevalecentes (análise de trajectórias da bola, percepção das movimentações dos colegas e adversários, ...). Num atleta que revele dificuldades ao nível da percepção de estímulos visuais, está comprometido um dos elos da cadeia (a captação do estímulo) e, por consequência, está condicionada negativamente a capacidade para ser rápido nas acções que deve desenvolver.

    De facto, a expressão da velocidade decorre, não apenas da brevidade de reacção aos estímulos ou da velocidade gestual, mas também do tempo necessário à identificação, ao tratamento rápido da informação e ao reconhecimento e avaliação das situações complexas de jogo. Como sustenta Paillard (1990), em matéria de tratamento da informação, o tempo de que se dispõe para operar é mais importante do que a quantidade ou a qualidade das acções a realizar.

    Verifica-se, contudo, que os estudos dirigidos para a compreensão da lógica da velocidade têm-se voltado, preponderantemente, para a parte observável da acção, ou seja para o tempo de movimento, enquanto que o lado invisível, relacionado com o tempo de reacção (Meignan & Audifren, 1997), inerente às questões do processamento da informação, nomeadamente nas facetas perceptiva e decisional, é tratado com menor incidência.

    A este facto não são alheias as conclusões provindas de alguns estudos realizados por especialistas, os quais, tendo por referência o peso dos factores genéticos e adaptativos, vêm difundindo a ideia de que a velocidade é a mais acondicionada geneticamente de todas as designadas características motoras básicas e que, portanto, a sua treinabilidade é reduzida.

    Consideramos, todavia, que esta é uma forma restritiva de colocar o problema, porque a realidade tem evidenciado que nos JDC as possibilidades de desenvolvimento da velocidade passam, em grande parte, pela exercitação conjugada das capacidades motoras com as habilidades táctico-técnicas, nas quais aspectos como a atenção, a capacidade de discriminação dos sinais pertinentes e a justeza decisional se revestem de uma importância fundamental. Neste sentido, o treino de tais factores tem permitido maximizar as valências musculares ou, nalguns casos, disfarçar até as suas limitações.

    A capacidade de previsão, por exemplo, permite que um jogador, mesmo sendo "mais lento" do que outro, do ponto de vista neuromuscular, possa chegar mais depressa a um determinado lugar do terreno de jogo, porque previu e antecipou a resposta.

    Atentemos nos movimentos basilares de locomoção dos jogadores, nas suas diferentes formas (marcha, trote, corrida rápida, sprint). Podemos constatar que as razões da sua expressão se fundam numa intencionalidade guiada, sobretudo, por imperativos tácticos. O jogador desloca-se para algum lugar, com maior ou menor intensidade, num ou noutro momento, em função da movimentação dos colegas e adversários, e da posição da bola, isto é, em função das configurações do jogo (Garganta, 1997).

    De acordo com este entendimento, a velocidade motora, longe de se restringir à acepção física do termo, que a situa como uma grandeza física, dada pela relação entre o espaço percorrido por um objecto e o tempo necessário para o percorrer, impõe-se, sobretudo, como uma grandeza táctico-técnica, perceptiva e informacional, que se consubstancia no que se pode designar por velocidade de realização, quando nos referimos à prestação individual do jogador, ou por velocidade de jogo, quando nos reportamos ao desempenho das tarefas da equipa, enquanto unidade colectiva, nas diferentes fases que o jogo atravessa.

    A velocidade de realização resulta, assim, da conjugação de diferentes e complementares aspectos, e.g., fisiológicos (nível de contractibilidade das fibras musculares), biomecânicos (intensidade, orientação e transmissão do complexo de forças em presença) e perceptivos (natureza dos receptores sensoriais que controlam o movimento). A velocidade de jogo resulta, não do somatório das velocidades parcelares de realização dos jogadores, tidos como célula ou individualidade, mas da forma como a equipa, enquanto superestrutura, gere os diferentes momentos configurações do jogo e a eles reage colectivamente, tal como um tecido celular inteligente.

    Tal sugere que, nos JDC, o facto da velocidade ser treinada através de exercícios nos quais se exige que a tarefa proposta se realize no mais breve tempo possível, é condição necessária mas não suficiente para que o efeito de treino se oriente no sentido pretendido. Para além de executar depressa é necessário executar bem, isto é, de forma ajustada.


2.1. A velocidade de jogo

    Os JDC praticados ao mais alto nível, são caracterizados por requererem um ritmo muito elevado e por reclamarem dos jogadores um empenho permanente. A existência de sistemas defensivos cada vez mais pressionantes implica exigências crescentes, nomeadamente no que se refere à velocidade de processamento da informação e de execução.

    No jogo ocorrem, cada vez com maior frequência, circunstâncias nas quais os jogadores devem realizar acções de adaptação com elevada velocidade. Todavia, ao atribuir-se às capacidades motoras um estatuto de autonomia, à margem do contexto táctico que as reclama, o significado de características como esta pode ser destorcido.

    Por isso, Brettschneider (1990) alerta quem pretender analisar os jogos desportivos e a prestação dos jogadores, para que o faça através da análise do contexto no qual ocorrem as acções, não se devendo limitar a aspectos isolados.

    Quando, tentando analisar parcelarmente os JDC, falamos em velocidade, no sentido restrito, não conseguimos um aporte de informação importante para melhorar a qualidade do treino e do jogo. A velocidade está sempre relacionada com o ajustamento temporal (Balash, 1998) e espacial das acções, e também com as características da tarefa a realizar. Trata-se, portanto, de uma velocidade táctico-técnica.

    Estando a velocidade intimamente associada a acções de intensidade maximal, alguns especialistas (ver por exemplo, Palfai, 1979; Ekblom, 1986) têm referido que aquilo que diferencia o nível dos jogadores e das equipas, no que respeita à actividade realizada durante as partidas, não é tanto o número de acções, mas fundamentalmente a intensidade com que elas são desenvolvidas.

    Quando os desportistas se movimentam em função de um móbil de jogo (a bola) e interactuam com elementos móveis dotados de autonomia (colegas e oponentes), as acções não podem ter uma duração fixa. A acção desenvolvida pelo sujeito decorre, não só da leitura da configuração do momento, mas também da previsível evolução das linhas de força do jogo, em função da velocidade de que se está animado para fazer coincidir a execução com o momento (tempo ) e o lugar (espaço) exigidos para obter êxito.

    De facto, a velocidade de realização parece ser um indicador do nível de jogo. Os melhores jogam mais depressa. Todavia, a intensidade com que um jogador executa as acções no jogo, depende, por um lado, da forma como ambas as equipas em confronto condicionam o ritmo do jogo, e, por outro, da qualidade das escolhas e das opções táctico-técnicas efectuadas pelo jogador no seu decurso.

    Sabe-se que não é apenas na forma, mas também no ritmo de execução das habilidades técnicas, que os jogadores mais talentosos se distinguem dos demais (Mercier, 1979). Contudo, a velocidade das acções do jogador adquire sentido quando relacionada com a velocidade de jogo, isto é, com a interacção de várias formas de manifestação parcelares que se entrecruzam e que vão desde a velocidade mental (Cianciabella, 1995) até à velocidade de deslocamento e de execução, numa interacção recorrente entre colegas e concorrente entre adversários.

    Quer isto confirmar que os melhores não jogam apenas mais depressa. Jogam, sobretudo, mais eficazmente, fazendo variar a velocidade de realização e de jogo, em função das características do momento e das possibilidades de evolução das linhas de força da jogada.

    O jogo em que o jogador se posicionava para receber a bola, depois observava, pensava e agia, faz pouco sentido no contexto actual. As marcações são cada vez mais pressionantes, a velocidade de jogo cada vez mais elevada, o tempo para agir cada vez mais curto, pelo que cada vez é mais premente a necessidade de realizar a antecipação mental e motora. Neste contexto, a compatibilização da velocidade com a precisão parece ser um problema importante.

    Já em 1951, Gibbs demonstrou que existe uma correlação negativa entre velocidade e precisão.

    Também se sabe, desde 1942 com Fulton, que o nível de precisão adquirido a baixa velocidade decresce rapidamente quando esta aumenta e que, pelo contrário, quando se pede a um indivíduo, que treinou a elevada velocidade, que procure cuidar os aspectos de precisão, ele perde pouca velocidade.

    Este preceito reveste-se de grande importância, nomeadamente pelas repercussões que pode ter quando se pretende eleger uma metodologia para promover a aquisição eficaz das diferentes habilidades técnicas nos JDC.

    Há, por isso, que considerar a relação da velocidade das acções com a precisão e com antecipação da resposta motora decorrente dos aspectos tácticos do jogo. Segundo Dugrand (1989), embora exista uma relação negativa entre velocidade e precisão, verifica-se uma relação positiva entre a velocidade e a "previsibilidade" das soluções retidas pelos jogadores.

    A este propósito, Bouthier (1988) sustenta que os jogadores mais experientes e os mais inteligentes se distinguem pelo apuro das capacidades de antecipação, quer na evolução das relações de oposição, quer nas escolhas tácticas mais ajustadas, quer ainda na execução das correspondentes operações que viabilizem o desencadeamento dessas acções em tempo útil.

    Também Ripoll (1979), num estudo em que comparou praticantes de Basquetebol com sujeitos não praticantes, demonstrou que os segundos, não obstante serem capazes de reconhecer uma considerável quantidade de informação sobre o jogo, ignoravam a sintaxe e o conteúdo semântico das mesmas.

 Neste âmbito, a capacidade de antecipação parece revelar-se um indicador fundamental para discriminar jogadores experientes ou inteligentes de jogadores principiantes ou pouco esclarecidos tacticamente (Tavares, 1994).


3. O treino da velocidade nos JDC

    Nos JDC há que considerar: (1) o treino da velocidade relacionado com as acções explosivas efectuadas em espaço reduzido, tais como saltos, travagens, mudanças de direcção, passes, remates, e outras actividades acíclicas; (2) o treino da velocidade de repetição, mais relacionado com as acções cíclicas, produzidas num espaço mais amplo, como por exemplo a corrida, com e sem bola.

    Dado que a prestação efectiva dos jogadores numa partida se prolonga por um período de tempo considerável, não basta ser rápido. É necessário sê-lo muitas vezes, sem perder eficácia. Deste modo uma das preocupações ao nível do treino é predispor o jogador para repetir a realização de acções rápidas, ao longo do jogo, sem que a sua velocidade de realização baixe drasticamente por aparecimento da fadiga.

    À capacidade que permite fazer face a este condicionamento dá-se o nome de velocidade-resistência. O treino desta capacidade é muito esgotante, tanto física como mentalmente, o que nos previne para a parcimónia com que deve ser abordado. Normalmente é usado em jogadores de elite, devendo evitar-se a sua aplicação a indivíduos com idade inferior a 16 anos (Bangsbo, 1994).


3.1. Objectivos

    Em função do que foi referido, parece plausível que através do treino da velocidade, nos JDC, se procure alcançar os seguintes objectivos:

  • incrementar a capacidade para decidir, rápida e ajustadamente, em resposta aos complexos de estímulos que caracterizam diferentes configurações de jogo (posição da bola, baliza, colegas, adversários, linhas de força do jogo, e outros);
  • aumentar a capacidade para executar rapidamente habilidades técnicas específicas em contextos que reproduzam a matriz do modelo de jogo que se pretende implementar (por exemplo, treinar a condução da bola ou o passe, na fase de contra-ataque, em situações de pressão espacial, com tempo e número de contactos com a bola limitados);
  • desenvolver a capacidade para gerar elevadas magnitudes de potência mecânica externa em acções ou sequências de elevada intensidade (saltos, sprints, mudanças bruscas de direcção, inversões bruscas de sentido, ...);
  • no que toca, particularmente, à velocidade-resistência: aumentar a capacidade de produção contínua de potência e energia; e incrementar a capacidade de recuperação após a realização de umexercício de alta intensidade.


3.2. Preceitos fundamentais

    Como já o referimos, o treino da velocidade no contexto dos JDC deve ser equacionado de forma a que haja um casamento óptimo entre a solicitação das valências perceptivas, decisionais e neuromusculares.

    Há, portanto, que reconhecer que os benefícios do treino da designada velocidade funcional, que integra os ingredientes do jogo, são bem mais significativos do que o treino formal de velocidade, este habitualmente associado aos sprints lineares realizados sem bola (Bangsbo, 1994).

    Nesta linha de raciocínio, para que o desenvolvimento da velocidade seja eficaz, nos JDC, parece-nos importante atender aos seguintes preceitos:

* Gerar esforços de intensidade maximal

    Para que se consiga uma adaptação efectiva é imprescindível exigir-se ao executante elevada concentração e máximo empenhamento na tarefa a realizar. O respeito por esta exigência é fundamental, dado que o exercício apenas induz a adaptação desejada se provocar a solicitação de um número significativo de unidades motoras, o que, por sua vez, reclama intensidade maximal na sua execução.

    Tal implica o respeito pelas seguintes condições:

  • é conveniente realizar o treino de velocidade no início das sessões, após um adequado aquecimento (Bangsbo, 1994). O desenvolvimento da velocidade deve ter lugar em condições de relativa frescura nervosa e muscular (Dick, 1989; Verkhoshansky, 1996a). Quando a fadiga começa a instalar-se a excitabilidade do sistema neuromuscular diminui, provocando também uma redução da coordenação intra e intermuscular e, com ela, uma diminuição da eficiência dos movimentos. Neste caso o efeito de treino orientar-se-á, sobretudo, para a velocidade-resistência;
  • os exercícios devem ser realizados durante períodos de tempo curtos, até 10 segundos;
  • os períodos de recuperação devem ser longos, com duração superior a cinco vezes o tempo de duração do exercício, de forma a permitir uma recuperação completa, e assim se criarem condições aos sistemas implicados para nova repetição ou série em regime de intensidade máxima (Quadro 1).


Quadro 1 - Referências metodológicas para o treino da velocidade (Bangsbo, 1994).

Treino de velocidade-resistência

Duração do exercício

Repouso

Intensidade

Repetições

2 -10 segundos

Superior a 5 vezes a duração do exercício

Máxima

2 -10 segundos

    Para o caso particular da velocidade-resistência, pode ter-se como referência exercícios realizados com intensidade quase máxima, com uma duração entre 20 e 40 segundos e intervalos de recuperação entre três e cinco vezes a duração do exercício. Os intervalos devem incluir actividades de repouso activo que acelerem a recuperação, como por exemplo corrida lenta (Quadro 2).


Quadro 2 - Referências metodológicas para o treino da velocidade-resistência (Bangsbo, 1994).

Treino de velocidade-resistência

Duração do exercício

Repouso

Intensidade

Repetições

20 -40 segundos

3-5 vezes a duração do exercício

Quase máxima (maximal)

2 -10 segundos


* Estabilizar o contexto de treino

    Importa criar um contexto de treino no qual as experiências motoras favoreçam a identificação de uma regularidade de certos efeitos. Isto permite que o praticante seleccione os aspectos fundamentais e que o treinador disponha de condições para o informar acerca da maior ou menor justeza dos seus comportamentos e dos aspectos sobre os quais deve actuar para ser eficaz.

    No âmbito energético-funcional, um dos aspectos a considerar é a realização de um volume de trabalho suficiente para provocar uma adaptação positiva. Dependendo embora da estrutura interna do exercício, do grau de motivação dos atletas e do seu estado de treino, para o desenvolvimento da velocidade parece razoável tomar-se como referência a execução de 2 a 10 séries de 2 a 10 repetições (Bangsbo, 1994).


* Desenvolver o complexo velocidade-precisão

    A procura da conjugação velocidade-precisão, aquando do treino das habilidades técnicas, é um aspecto importante a ter em conta, no sentido do aperfeiçoamento do controlo da alternância da contracção e descontracção dos músculos esqueléticos, i.e., da coordenação intra e intermuscular (Israel & Buhl, 1982), em função dos padrões de movimento típicos da modalidade e também da adaptabilidade na realização de movimentos atípicos.

    Não obstante pesquisas, efectuadas no âmbito da Psicologia do Trabalho, tenham demonstrado que toda a aprendizagem é acompanhada de um aumento de velocidade de realização do sujeito para a tarefa considerada (Leplat, 1970 cit. Jalabert, 1998), sabe-se que existe um limiar de velocidade abaixo e acima do qual o desenvolvimento da velocidade não se faz sentir. Enquanto que no primeiro caso a precisão das acções raramente é perturbada, no segundo ela torna-se praticamente inacessível (Jalabert, 1998).

    Assim, impõe-se a adopção de uma velocidade crítica que viabilize a relação optimal entre a velocidade e a precisão, não ignorando que a mesma varia, entre outros aspectos, com a complexidade da tarefa a realizar e com o nível do praticante.

    Para que o desenvolvimento do complexo velocidade-precisão não fique comprometido, o jogador deve ter assimilado e estabilizado o estereótipo dinâmico motor relativo aos requisitos fundamentais das habilidades técnicas.

    As habilidades técnicas devem ser aprendidas e estabilizadas a velocidades relativamente baixas. Contudo, é ao experimentar acções executadas a velocidades superiores, que o praticante adquire a correspondente imagem sensório-motora do movimento (Verkhoshansky, 1996a). Por essa razão e também porque o transfere da técnica aprendida a baixa velocidade para exigências de alta velocidade é extraordinariamente complexo (Dick, 1989), o atleta deve ser encorajado a consolidar a técnica acelerando, aumentando a intensidade.

    Neste sentido, preconiza-se a realização de exercícios de velocidade funcional (Bangsbo, 1994), os quais devem reproduzir, não só o padrão estrutural dos movimentos a adoptar, mas também a velocidade crítica com que os mesmos devem ser executados (Verkhoshansky, 1996b).

    É óbvio que ao pretender-se desenvolver a velocidade funcional, deve garantir-se que os atletas assegurem a continuidade das acções, o que implica, por exemplo, que saibam receber a bola e passá-la em condições de ser jogada, ou conduzi-la em progressão sem perder o seu controlo. Se os atletas estiverem constantemente a perder o controlo da bola, a continuidade e a ligação das acções ficará comprometida e, por consequência, estará também comprometido o desenvolvimento da velocidade.


* Desenvolver a velocidade em contextos de interferência táctico-técnica

    O desenvolvimento da velocidade em contextos de interferência táctico-técnica revela-se muito importante. Neste domínio a procura da individualização da carga e da diferenciação do conteúdo, em função do estatuto posicional e das características dos jogadores (Morth, 1998), são aspectos a considerar.

    Para dar resposta a esta intenção torna-se muito importante o recurso a "complexos táctico-técnicos", entendidos como conjuntos de exercícios que, inspirados na matriz do modelo de jogo a perseguir, induzem um desenvolvimento motor específico do sistema funcional dos jogadores e da equipa.

    É conveniente, por exemplo, adoptar exercícios rítmicos que levem o jogador e a equipa a reagirem, o mais rapidamente e o melhor possível, à situação de perda ou conquista do móbil do jogo (bola, ...), com o intuito de criar desequilíbrios súbitos no balanço ataque-defesa ou defesa-ataque e surpreender o adversário.


* Dar uma intenção funcional à acção a desenvolver

    Um jogador que leia ou interprete o jogo duma forma deficiente, mesmo que seja rápido na execução de acções individuais, não consegue, habitualmente, adoptar soluções proveitosas para a equipa.

    Sabendo que o projecto de intenção, relativo a uma determinada acção, guia já essa mesma acção no plano perceptivo (Jeannerod, 1985), deve procurar-se que as intenções de acção resultem duma análise funcional do movimento adaptado às competências reais do executante e aos requisitos próprios do jogo. Neste sentido elas favorecem a selecção, a ligação das informações e induzem ganhos na velocidade de realização.


* Atender à especificidade do contexto

    No treino da velocidade deve adoptar-se formas e situações similares às do jogo, perseguindo o denominado treino da velocidade funcional (Bangsbo, 1994).

    Tenha-se em consideração, no entanto, que os tipos de solicitações de um jogo de Futebol são diferentes das reclamadas por um jogo de Basquetebol e estas diferem das exigências típicas de um jogo de Hóquei em Patins. Este facto torna imprescindível a necessidade de perfilar a especificidade (o bilhete de identidade) da modalidade desportiva em questão.


4. Conclusões

    O que interessa aos JDC não é o desenvolvimento de capacidades absolutas-máximas, mas de capacidades relativas-optimais que permitam ao jogador ser eficaz em relação às configurações de jogo com que depara.

    Por isso, a velocidade, como qualquer outra capacidade configurada a partir da dimensão energético-funcional, não é, nos JDC, uma faculdade substantiva, mas uma capacidade subsidiária do rendimento, a qual adquire sentido quando perspectivada em função do contexto que justifica a sua expressão.

    Considerando este pressuposto, a organização do processo de treino deve partir, antes de mais, do modelo de actividade que se pretende que os jogadores desenvolvam, para dar resposta ao modelo de jogo preconizado pelo treinador, embora se possa acentuar a valência muscular ou informacional, em função de aspectos como, por exemplo, o momento do treino (sessão de treino, microciclo, mesociclo) e as características dos atletas (idade, anos de treino, perfil fisiológico, etc.).

    Este entendimento implica que o treino da velocidade seja perspectivado duma forma integrada e aplicada, na qual o protagonismo excessivo do condicionamento atlético dá lugar à solicitação conjugada da(s) velocidade(s) de percepção, decisão e realização, consubstanciada em sequências rítmica de comportamentos táctico-técnicos que traduzem a velocidade de jogo.

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